7 mares

O caso do cinema negro brasileiro

Papirus lança livro que trata da representatividade do negro na filmografia nacional

Apesar de o Brasil ser um país majoritariamente negro, com uma crescente discussão sobre preconceito e racismo estrutural, ainda é diminuto o número de filmes com negros ocupando papéis de destaque ou protagonismo. Lamentavelmente, o mesmo acontece com a produção de livros nessa área. Uma frente fundamental do cinema ficou parcialmente esquecida: o ensino e a pesquisa. É nesse sentido que Cinema negro brasileiro (Papirus, 288 pp., R$ 89,90), livro organizado por Noel dos Santos Carvalho, é muito bem-vindo, pois avança sobre esse tema até agora pouco estudado.

Na obra, um conjunto de artigos e autores mostra como a produção e a pesquisa sobre cinema são formas potentes de pensamentos sobre o Brasil e suas contradições. Como bem aponta Fernão Ramos, coordenador da Coleção Campo Imagético, na qual a coletânea está inserida, a publicação “traz um debate central da contemporaneidade para o campo do cinema brasileiro. As alteridades sociais, de etnia ou gênero, compõem o espaço a que alguns se referem como identitário. Misturam-se, no caso brasileiro, a demandas sociais diversas que afligem não só as minorias, mas a imensa maioria da população”.

Esse livro busca contribuir para o pensamento sobre o cinema negro brasileiro. Estudos nesse campo são recentes e têm crescido em número e qualidade nas últimas duas décadas. O cinema negro aparece relacionado a três ordens de fenômenos: 1) os filmes dirigidos por realizadores(as) negros(as) e suas trajetórias; 2) a atuação polêmica e/ou autoral de atores e atrizes; e 3) a institucionalização do cinema negro e suas propostas estéticas e políticas inovadoras.

As questões abordadas nos capítulos estão presentes desde os primórdios de nosso cinema, passando pelos “filmes da retomada no fim de século e depois na explosão da produção que traz a experiência do racismo como fala própria, do lado de lá, no cinema mais jovem da segunda década do novo milênio. A vivência do preconceito e do racismo está nas imagens das produtoras alternativas digitais que emergiram com as grandes manifestações de meados dos anos 2010”, conforme pontua Ramos.

Ele destaca ainda que a obra traz “um caleidoscópio do conjunto dessa posição, inaugurando um novo recorte na tradicional linha diacrônica da historiografia tradicional. Constrói uma espécie de âncora alternativa, dialogando de modo dinâmico com o cânone da história do cinema fundado no século passado, sem escorregar na ameba midiática. Questiona, assim, uma visão antes mais homogênea e unitária da identidade popular e sua consciência”.

Para o premiado cineasta Jeferson De, que assina a apresentação, estudantes, pesquisadores e leitores interessados terão, em Cinema negro brasileiro, “um guia para se orientar na compreensão dos cinemas negros. E um ponto de partida para avançar na realização de um cinema alinhado com a nossa população e cultura”.

Sobre os autores:

Noel dos Santos Carvalho (org.), doutor em Sociologia pela USP, é professor de Cinema no Instituto de Artes da Unicamp. Realiza pesquisas no campo da sociologia do cinema. Nos anos 1990, integrou o grupo de cineastas que criou o manifesto Dogma Feijoada – Gênese do Cinema Negro Brasileiro.

Carolinne Mendes da Silva é mestre e doutora em História Social pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, onde também cursou o bacharelado e a licenciatura. Professora de História, atua à frente do Núcleo de Educação para as Relações Étnico-Raciais da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo (SME-SP). Desenvolve pesquisas na área de educação, relações raciais e de gênero e história do cinema brasileiro. É autora do livro O negro no cinema brasileiro (LiberArs, 2017).

Clarissa Cé de Oliveira é formada em Produção Audiovisual pela PUC-RS e em Jornalismo pela UFRGS. Trabalha como repórter na PixTv e suas principais áreas de interesse são cinema, literatura e estudos de gênero.

Cristina Matos, doutora em Sociologia pela UFC, é professora do Departamento de Ciências Sociais e do Programa de Pós-graduação em Sociologia da UFPB. Publicou, entre outros: Rádios comunitárias, sintonia dissonante e autoimagem; Cinema brasileiro, tempo passado e tempo presente: O lugar da memória e a questão racial; Da teoria ao ato: Refletindo sobre educação, reconhecimento e antirracismo.

Edileuza Penha de Souza, doutora em Educação pela UnB, onde cursou o pós-doutorado em Comunicação, é professora, documentarista e pesquisadora, além de idealizadora e coordenadora da Mostra Competitiva de Cineastas e Produtoras Negras Adélia Sampaio.

Ella Shohat é professora da Universidade de Nova York nos departamentos de Arte e Políticas Públicas e Oriente Médio e Estudos Islâmicos. Tem experiência em pesquisas relacionadas com as abordagens pós-coloniais e transnacionais e estudos culturais. Escreveu e organizou diversos livros e artigos, entre os quais Israeli cinema: East/west and the politics of representation (Univ. of Texas Press, 1989); Talking visions: Multicultural feminism in a transnational age (MIT & The New Museum of Contemporary Art, 1998); Taboo memories, diasporic voices (Duke University Press, 2006). No Brasil, publicou em coautoria com Robert Stam o livro Crítica da imagem eurocêntrica (Cosac &Naify, 2006).

Gilberto Alexandre Sobrinho é licenciado e mestre em Letras pela Unesp, de São José do Rio Preto/SP, doutor em Multimeios e livre-docente pela Unicamp. Realizou pós-doutorado no Departamento de Cinema da Universidade de Nova York, EUA. É professor no Instituto de Artes da Unicamp e foi professor visitante na Universidade Estadual de San Francisco, EUA, e na Universidade Iberoamericana, México. Publicou O autor multiplicado (Alameda, 2012) e organizou Cinemas em redes (Papirus, 2016), entre outros livros. Tem publicações nacionais e internacionais de artigos e capítulos de livros. É realizador de documentários.

Kênia Freitas é doutora em Comunicação e Cultura pela UFRJ, fez estágios de pós-doutorado em Comunicação na UCB e na Unesp de Bauru/SP. É curadora e programadora do Cinema do Dragão (Fortaleza/CE), além de integrar o Fórum Itinerante de Cinema Negro (Ficine). Tem artigos publicados, entre eles: “Experiência estética, alteridade e fabulação no cinema negro” (Revista Eco-Pós, 2018); “O futuro será negro ou não será: Afrofuturismo versus Afropessimismo – As distopias do presente” (Revista Imagofagia, 2018); e “Cinema negro brasileiro: Uma potência de expansão infinita” (20o FestCurtasBH, 2018).

Luis Felipe Kojima Hirano é bacharel em Ciências Sociais pela USP, onde cursou o doutorado em Antropologia Social. Professor de Antropologia da UFG, integra o Comitê de Antropologia Visual da Associação Brasileira de Antropologia (ABA) e a Comissão de Imagem e Som da Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs). Conquistou o segundo lugar na categoria de Ciências Sociais na sexta edição do prêmio Abeu pelo livro Grande Otelo: Um intérprete do cinema e do racismo no Brasil (Ed. UFMG, 2019).

Natasha Roberta dos Santos Rodrigues é bacharel em Midialogia pela Unicamp, onde cursa o mestrado no Programa de Pós-graduação em Multimeios. Dirigiu os curtas-metragens documentais Cabeças falantes (2017) e Àprova (2020). Atua como arte-educadora e agente cineclubista da Spcine Segunda Edição (2022).

Paula Halperin é diretora da Faculdade de Cinema e Mídia e professora de História e Cinema na Universidade do Estado de Nova York, Purchase (Suny Purchase). Foi professora visitante na Unirio. Investiga os temas: mídia, história e esfera pública no Brasil durante o século XX, com ênfase na ditadura militar. Suas publicações acadêmicas se especializam em televisão e cinema. Seus trabalhos têm sido publicados em revistas acadêmicas nos Estados Unidos, no Brasil e na Argentina. Está finalizando o livro Nacionalismo e imaginação histórica: Cinema popular no Brasil e na Argentina na década de 70. Escreve regularmente críticas cinematográficas em revistas, blogs e sites de cinema.

Pedro Vinicius Asterito Lapera, doutor em Comunicação pela UFF, é pesquisador da Fundação Biblioteca Nacional (FBN). Possui como áreas de interesse a relação entre cinema e história, cinema e ciências sociais, cinema na Primeira República, tendo publicado artigos nas revistas Tempo (PPGH/UFF), Mana (PPGAS/UFRJ), Matrizes (PPGCOM/USP) E-compós (Compós), Cadernos Pagu (Unicamp) e Revista Brasileira de História (Anpuh).

Robert Stam é professor da Universidade de Nova York. Autor e organizador de dezoito livros sobre cinema e teoria cultural, cinema nacional (francês e brasileiro), raça comparada e estudos pós-coloniais, além de artigos e entrevistas nas principais revistas especializadas, no Brasil tem publicado os seguintes títulos: O espetáculo interrompido: Literatura e cinema de desmistificação (Paz e Terra, 1981); Bakhtin: Da teoria literária à cultura de massa (Ática, 1992); Introdução à teoria do cinema (Papirus, 2003); Multiculturalismo tropical: Uma história comparativa da raça na cultura (Edusp, 2008); A literatura através do cinema: Realismo, magia e arte da adaptação (UFMG, 2008); e Crítica da imagem eurocêntrica (Cosac & Naify, 2006), em coautoria com Ella Shohat.

Roberto Carlos da Silva Borges é professor titular do Departamento de Línguas Estrangeiras Aplicadas às Negociações Internacionais (Leani) e do Programa de Pós-graduação em Relações Étnico-Raciais (PPRER) do Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (Cefet-RJ). Pesquisa as mídias e os filmes produzidos e protagonizados por negros. É diretor de ensino do Cefet-RJ, diretor de áreas acadêmicas da Associação Internacional de Investigadores e Investigadoras Negros e Negras da América Latina e do Caribe (Ainalc) e membro do grupo de trabalho Afrodescendência e Propostas Contra-hegemônicas do Conselho Latino-americano de Ciências Sociais (Clacso).

Rosane Borges, doutora em Ciências da Comunicação, é jornalista, pesquisadora do Colabor (ECA-USP) e professora convidada do Diversitas (FFLCH-USP). Articulista da revista IstoÉ, escreve ocasionalmente para a Folha de S.Paulo. É autora e organizadora de diversos livros, entre eles: Espelho infiel: O negro no jornalismo brasileiro (Imprensa Oficial, 2004); Perfil biográfico de Sueli Carneiro (2009); Mídia e racismo (DP et Alii, 2012), Esboços de um tempo presente (Malê, 2016) e Fragmentos do tempo presente (Aquilombô, 2021).

Samuel Silva Rodrigues de Oliveira, mestre em História pela UFMG e doutor em História, Política e Bens Culturais pelo CPDOC-FGV, é professor e pesquisador no Programa de Pós-graduação em Relações Étnico-Raciais do Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (Cefet-RJ). Bolsista de Produtividade em Pesquisa do CNPq e Jovem Cientista de Nosso Estado da Faperj, investiga a cultura visual, a memória social, as relações raciais e a cidadania na história contemporânea do Brasil.

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